Encéfago: a improvável constituição de um homem feudiano. |
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terça-feira, 7 de fevereiro de 2012
Papai Noel de verdade!
Uma história de Natal
Publicado originalmente em 20 de novembro de 2011, no Facebook
Desde que me lembro, tenho tratado o Natal com certo ceticismo. Um
dos primeiro episódios de Natal de que minha memória alcança está
relacionado a um pequeno avião teco-teco azul de cordas que ganhei dos
meus pais um pouco antes do Natal, mas que valia para ele: eu brincava
com meu aviãozinho pelo chão vermelho da sala (é claro que ele não
voava), enquanto minha irmã brincava com sei lá o que ela tinha ganhado;
brincadeira vai, brincadeira vem, ela comentou comigo que o seu
presente havia sido deixado pelo Papai Noel, então entrou em ação todo o
ceticismo de irmão-mais-velho que eu podia ajuntar aos sete anos de
idade em minhas afirmações e sapequei logo que essa coisa de Papai Noel
não existe; a partir daí, talvez a minha imaginação tenha inventado ou
tenha mesmo acontecido, não posso afirmar, minha mãe, após lançar olhar a
um só tempo sério e grave em minha direção, resgatou ou tentou
resgatar, não sei com que sucesso, a fé da minha irmã no bondoso
velhinho. Posso afirmar com certeza que a história do homem de vermelho
que distribuía presentes nunca suscitou em mim grande credibilidade
enquanto criança: desde que me lembro, duvido dessa história.
Acredito que crianças que um dia tenham acreditado nessa, e na maioria
das outras histórias que se conta para crianças, as boas e as más,
envelhece de forma mais decidida. Às vezes o mundo adulto reluta em
tentar me convencer da sua seriedade. Um dos episódios que ilustra o que
acabo de afirmar aconteceu há cerca de um ano. Eu e a Sílvia, usando e
abusando da novidade de morar perto do Paraguai, fomos a Pedro Juan
Caballero a fim de comprar alguns presentes de Natal para os sobrinhos.
Pesquisamos, escolhemos, compramos aquilo que considerávamos uma
pechincha e, uma vez cumpridas as obrigações consumistas, os presentes
devidamente acomodados no porta-malas do carro, voltamos à loja para um
almoço breve, antes de voltarmos para a estrada – esses dias de compras
podem ser muito corridos. Quando voltamos para a praça de alimentação,
para a minha surpresa, estava o santo que tinha sido alvo das minhas
blasfêmias sentado, todo de vermelho, com seu uniforme vermelho oficial,
comendo com alguma urgência o seu almoço terrivelmente real. Seu rosto
severo, velho, talvez até mesmo triste, debruçado sobre o prato,
concentrado na refeição; suas mãos velhas, mas firmes, conduziam com uma
veracidade infalível o garfo por entre sua branca e natural barba.
Enquanto estive ali, observando aquele velho, seu almoço foi
interrompido apenas uma vez por uma pai que cedeu aos pedidos do filho
para bater uma foto com o velho Noel, que posava sem muita alegria, mas
disposto e educado; acho que ele pediu um chope antes de sair. Por todas
essas coisas, a velhice real, a barba verdadeira, a tristeza íntima, a
cerveja após a refeição, foi que aquela figura me pareceu bastante
verossímil. Tive a impressão de estar, por alguns instantes, diante do
Papai Noel verdadeiro. O Papai Noel que a minha infância nunca me
mostrou.
Sabe, não vi o momento em que ele
se levantou para ir embora, apenas observei o seu lugar vazio depois.
Aquele foi o momento mais onírico de um dia que tinha sido, até então,
terrivelmente real, e que continuou insuportavelmente real, depois. Um
interlúdio poético de uma peça extremamente séria que contradizia a
realidade; um fantasma de um sonho alheio que visitou a minha vida
banal: um hiato na realidade de um ano inteiro. A minha infância me
visitou ali?
segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012
O HOMEM PÁSSARO
Um dia ele acordou e estava exatamente como na noite anterior. Ele não
teve dúvidas, fez o que qualquer pessoa faria, costurou um bico em seu
próprio rosto. Só assim ele conseguiu ser ele mesmo.
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